O ano eleitoral tende a acirrar o debate em torno dos mais variados temas. A campanha presidencial de 2010, em particular, promete guardar um espaço considerável para um acalorado debate em torno da política exterior do Brasil. Área tradicionalmente reservada aos iniciados (diplomatas ou acadêmicos), a política externa tem conquistado espaço cada vez maior no debate político nacional. Tal fato se deve, essencialmente, a dois fatores complementares: o primeiro referente à dinâmica de evolução do debate político interno e o segundo, à condução da própria política externa brasileira nos últimos anos.
Com a consolidação da democracia (a partir dos anos 1980), a estabilização econômica (a partir dos anos 1990) e a incorporação efetiva da questão social (intensificada nos anos 2000), houve, na política interna, uma tendência à convergência crescente entre os principais partidos competidores (particularmente, PT e PSDB) em torno das linhas gerais a serem seguidas. O debate passou a concentrar-se, já há alguns anos, em aspectos morais e de gestão. Nesse contexto, a política externa emergiu como área de escape (retórico ao menos) para as pretensões esquerdistas de parte do governo e foco de críticas substantivas por parte de setores da oposição.
Tal dinâmica de antagonismo alimenta e é alimentada pelo crescente alcance e pelo modo como tem sido conduzida a política externa do país no governo Lula. Como bem gostaria o presidente, “nunca antes na história desse país” esteve o próprio país – e sua política exterior – tão em alta. Como bem destacou recente matéria do The Wall Street Journal (publicada em 29/3), “de repente, o que o Brasil diz e faz importa no exterior”. Para além das conquistas internas, isto se deve, em parte, ao prestígio do presidente Lula (eleito estadista global no início do ano) e, em certa medida, à bem-sucedida estratégia de ampliação das parcerias, que não apenas assegurou mercados, mas ampliou a capacidade de interlocução do país.
A maior visibilidade externa não significou, contudo, o apaziguamento das divergências internas em torno da política externa – nem dele resultou. Ocorreu, de fato, sob acalorado debate a respeito do papel do Brasil na América do Sul e no mundo. A participação brasileira na crise de Honduras, o tratamento dos direitos humanos e a pretensão de mediar a questão nuclear iraniana são todos temas candentes, que deverão alimentar o debate em torno da condução da política externa brasileira e do papel do Brasil no mundo. Além deles, as frequentes crises com a Argentina, as reclamações paraguaias e uruguaias com as persistentes assimetrias no Mercosul e outras dificuldades para implementar um sólido projeto de integração deverão agregar elementos à disputa eleitoral em torno da política exterior. Somados, esses fatores devem assegurar um pouco de emoção e um espaço para o embate de ideias nas eleições de outubro.
José Romero Pereira Júnior é professor de Relações Internacionais e Coordenador da Pós-Graduação em Relações Internacionais e Diplomáticas da América do Sul da Universidade Católica de Brasília (romero@ucb.br).
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